Há tempos que quero escrever… mas as palavras, essas, fogem-me sempre. Ou porque não sei por onde começar, ou porque não tenho a coragem certa para o fazer. Hoje não escrevo por obrigação — ninguém tem o dever de contar a própria vida, mas escrevo, porque sinto que vos devo esta partilha.
Decidi reformular este blog. Quis dar-lhe o peso certo de um espaço mais leve, longe da exigência das redes sociais. Um lugar leve. Reorganizei também o sótão, o meu atelier, e arrumei cada caixa, cada tecido, cada pequeno objeto. Estava tudo a transbordar e atolado de coisas que já não me pertenciam no coração. Foi libertador. Comprei até uma nova máquina de costura! Quero voltar a escrever como antes — sem pressa, sem métricas, apenas pelo prazer de criar. Como sempre fazíamos, quando queríamos mostrar as nossas receitas, os nossos projetos de costura, as fotografias, etc... Os blogs fazem falta!
Mas hoje o meu atelier está vazio! Tudo está embalado e encaixotado.
Uma semana depois de arrumar tudo, recebi a notícia: que teríamos de deixar a "nossa" casa. Quinze anos em Azeitão.
Uma casa arrendada nunca é, de facto, nossa.
Talvez, no fundo, eu já soubesse que esta etapa chegava ao fim. Azeitão teria o seu tempo. O clima mudou, os verões tornaram-se secos, insuportáveis e sufocantes, prolongando-se até novembro. Obrigam-nos a viver com tudo fechado e no escuro. E, desde que o meu pai partiu, a solidão cresceu. Aqui não chegou um abraço que esperava, o telefonema de quem se importa, o toque na campainha, o convite para um café. Eu fiquei doente, deprimida e sozinha. Ficou apenas silêncio. E nesse silêncio, afastei-me de quem não procura (amigos, família, etc...), quem nunca chega, quem se lembra muito, mas não interage e aproximei-me de Deus e da Igreja. Primeiro na Lapa, que me ensinou tanto e me acolheu tão bem, depois na Igreja Católica. É facto que estou em casa e que vivo para a minha família em primeiro lugar e para o bem estar do meu lar; e que as outras famílias, têm empregos e vidas muito ocupadas e que pouco tempo lhes sobra. E cada um cuida de si da melhor forma que encontra, sem dever e obrigações. E está tudo bem.
"Chegai-vos a Deus, e Ele se chegará a vós" (Tiago 4:8).
A notícia abalou-me.
Vou sentir falta da casa — muito. Sentirei saudades da lareira acesa nos dias frios, da janela aberta para o jardim.
Mesmo quando não entendemos, Deus é sempre Bom e Generoso. Vejo, esta mudança, como uma lição que Deus escolheu para mim, do desapego do que não me pertence mais. Tenho tanto para aprender se quero a minha vida salva na eternidade.
"Não acumuleis para vós tesouros na terra… mas ajuntai tesouros no céu" (Mateus 6:19-20). Estou a aprender a lição dura e libertadora do desapego, para que o coração fique mais cheio do que é eterno.
Para onde vamos, não teremos uma sala, nem sofás, nem todos os móveis que um dia escolhemos com tanto carinho. Mas teremos um teto. Na Graça de Deus terei o meu marido e o meu filho, o que mais importa?
Voltaremos em breve à minha terra. Voltarei a ver o mar. Lá, o clima é mais fresco. Já há tantos que me esperam.
No entanto sinto sempre que o campo será sempre o meu lugar.
"tudo posso naquele que me fortalece" (Filipenses 4:13).
Com fé
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